Avançar para o conteúdo principal

Distorções cognitivas: o que são e como é que podem agravar a sua resposta de stress e de ansiedade

 


Será que desconfiar dos seus pensamentos, significa duvidar de si? Claro que não! Os pensamentos que tem sobre si, sobre os outros e sobre o mundo, não refletem a realidade, mas sim, a perceção que tem dela - e como sabe, a sua perceção é influenciada por diversos fatores, nomeadamente a genética, o ambiente familiar, a cultura, entre outros.

O que são distorções cognitivas

As distorções cognitivas são determinados tipos de pensamentos que induzem as pessoas a interpretarem a realidade de forma mais negativa do que ela realmente é. Geralmente, estes tipos de pensamentos ocorrem particularmente nos momentos de elevado stress, mas como são muito subtis, torna-se difícil reconhecê-los. Fique a conhecer as distorções cognitivas mais comuns e exemplos de situações onde pode usá-las.

  • Pensamento tudo ou nada/preto ou branco

Este tipo de distorção cognitiva ocorre quando a pessoa se foca nos extremos, sem considerar os pontos intermédios, isto é, não há meio-termo. Por exemplo, se é daquelas pessoas que considera que tudo o que faz tem de ficar perfeito, caso contrário não as faz, então há uma elevada probabilidade de estar a usar este tipo de distorção cognitiva. 

  • Generalização

Ocorre quando a pessoa utiliza o resultado de um evento negativo e generaliza para todas as outras situações que possam ser similares ou não. Por exemplo, quando alguma coisa corre mal, a pessoa tem por hábito pensar “a mim tudo me acontece” ou então quando algo corre mal logo pela manhã, e pensa “pronto, já estragou o meu dia”. Este tipo de distorção cognitiva é fortemente marcado pelo uso de expressões como: sempre e nunca.

  • Raciocínio emocional

Ocorre quando a pessoa assume que a forma como se está a sentir reflete a realidade, sem ter evidências que suportam os seus pensamentos.  Por exemplo, “senti-me uma incompetente porque enganei-me a fazer uma tarefa”, então acha que “sou uma incompetente”.

  • Rotulagem

Ocorre quando a pessoa utiliza rótulos pejorativos para descrever a si ou aos outros perante uma determinada situação. Por exemplo, “sou uma parva”; “sou uma idiota” ou então aquela pessoa “é irresponsável”.  A rotulagem, muitas vezes, ocorre em simultâneo com o raciocínio emocional e é também uma forma de generalização porque em vez de avaliar o comportamento em causa, usa o comportamento para descrever a si ou aos outros.

  •  Filtro mental

O ocorre quando a pessoa se foca apenas nos pontos negativos, filtrando os aspetos positivos de um determinado evento ou situação. Já lhe aconteceu realizar um trabalho e receber comentários sobre o que fez bem e sobre o que tem de melhorar, porém, passou dias a ruminar sobre o que não fez bem, sem considerar o que fez bem?

  • Catastrofização

A catastrofização ocorre quando a pessoa prevê o futuro, assumindo que o pior cenário já aconteceu ou então que vai acontecer, sem considerar outros cenários possíveis. Por exemplo, se a pessoa se sente insegura na relação e o/a parceiro/a está atrasado/a, pode pensar: “ainda não chegou, está com outro/a”; ou imagine um aluno que teve negativa num teste de matemática e pensa: “vou chumbar a matemática”.

  • Desqualificar o positivo e leitura da mente

Desqualificar o positivo, ocorre quando a pessoa desvaloriza o comentário positivo que recebeu. Já lhe aconteceu alguém elogiar-lhe pelo trabalho que fez e pensou: “o que fiz, não foi nada de especial”; ou “toda gente conseguiria fazer o que eu fiz” ou então “apenas está a ser simpático”.

Talvez possa estar a pensar, “mas a pessoa pode de facto estar apenas a ser simpática”. Sim, sem dúvida! Contudo, esta pessoa também pode estar a ser genuína, certo?  Se assumir que a pessoa está apenas a ser simpática, sem realmente ter evidências que suportam a sua assunção, então neste caso está a usar uma outra distorção cognitiva denominada de leitura da mente - ocorre quando a pessoa assume que sabe o que o outro está a pensar, sentir e a razão pela qual se comporta da forma que se comporta.

  • Personalização

Se é daquelas pessoas que se sente sempre culpada por tudo que acontece, a probabilidade de estar a usar esta distorção cognitiva é muito alta. Por exemplo, se o seu filho ficou doente e acha que é uma péssima mãe. A personalização ocorre quando a pessoa assume a responsabilidade total quando algo corre mal, sem ter o total controlo sobre o mesmo.

  • Afirmações como: deveria…

Por fim, as afirmações como deveria, são regras arbitrárias que a pessoa estabelece, particularmente quando se quer automotivar ou então motivar o outro para fazer algo. Por exemplo “deveria comer de forma mais saudável”; ou “deveria fazer exercício físico mais vezes” ou “deveria deixar de fumar”. O uso desta expressão está associado a emoções como a culpa e a vergonha, que certamente não são os melhores estados emocionais quando se quer iniciar algo. 

De uma forma geral, a maioria de nós, se não todos, usamos alguns tipos destas distorções cognitivas. Porém, atendendo a que os nossos pensamentos influenciam a forma como nos sentimos e nos comportamos, ao considerarmos estes pensamentos como sendo factos, para além de amplificarmos a nossa resposta emocional perante situações de stress e ansiedade, tomamos decisões com base em assunções erradas acerca de nós, dos outros e/ou do mundo. Mais, o uso destas distorções de forma repetida compromete o nosso bem-estar físico e psicológico, porque contribui para uma baixa autoconfiança, baixa autoestima, e ainda para o desenvolvimento e/ou para a manutenção de doenças físicas como o stress crónico e as perturbações psicológicas como a ansiedade e a depressão.

Num próximo artigo sobre esta temática, abordarei mais exemplos de distorções cognitivas e de possíveis estratégias que possamos usar para lidar com as mesmas.

Jacqueline Ferreira 

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Sinais de depressão em crianças e adolescentes: a importância da identificação precoce

  A depressão é uma perturbação de humor que pode afetar a todos, incluindo crianças e adolescentes.  Esta condição pode interferir com desenvolvimento físico e psicológico, com o estabelecimento das relações interpessoais, com o desempenho escolar, e se não for identificada atempadamente pode acarretar sérias repercussões a longo prazo. Quais são as causas da depressão nas crianças e nos adolescentes? A depressão pode ser causada por vários fatores , tais como, biológicos, psicológicos e sociais/ambientais. Os fatores mais comuns que podem contribuir para o desenvolvimento de depressão nas crianças e nos adolescentes são: Problemas familiares (ex., conflitos, divórcio); Baixo rendimento ou insucesso escolar; Situações de violência emocional, sexual e física; Bullying ou conflitos com os colegas; Histórico familiar de depressão ou outras condições mentais (ex., perturbação de ansiedade, perturbação de hiperatividade e défice de atenção, dificuldades de aprendizagem espec...
  A urgência de um relacionamento amoroso e as suas consequências Vivemos numa sociedade que valoriza e idealiza as relações amorosas, promovendo a ideia de que encontrar um(a) parceiro(a) é essencial para a realização pessoal e felicidade. Este contexto sociocultural pode gerar uma pressão intensa, levando muitos(as) a procurar relacionamentos de forma urgente e, por vezes, precipitada. Mas, será que se está verdadeiramente preparado(a) para estas relações? Ou será que a urgência de encontrar um(a) parceiro(a), muitas vezes, impede o estabelecimento de relações amorosas saudáveis e duradouras?          A influência da sociedade é poderosa, e pode moldar as expectativas e crenças sobre o que é necessário para sermos felizes. Desde a infância, somos expostos(as) a mensagens que engrandecem o amor romântico como o ápice da realização pessoal, através, por exemplo, de filmes, músicas e redes sociais, que levam à criação de uma imagem irrealista do amor e das r...

Do Pensamento à Ação: Como os pensamentos influenciam os nossos sentimentos e as nossas decisões

  Já alguma vez se perguntou por que se sente de determinada forma ou por que agiu de certa maneira? Os pensamentos são a base da nossa experiência interna e têm impacto direto nas nossas ações e comportamentos. A forma como pensamos influencia a maneira como percebemos, sentimos e interagimos com o mundo. Os pensamentos são processos mentais que podem ser conscientes ou inconscientes, surgindo de forma espontânea ou em resposta a um estímulo. Estes envolvem, por exemplo, o processamento de informações, imagens e memórias e desempenham um papel crucial na forma como nos sentimos, na nossa tomada de decisão e na resolução de problemas. Os pensamentos podem ser classificados de várias formas, consoante o impacto que têm nas emoções e nos comportamentos, a saber:  - Pen samentos automáticos:  Surgem de forma rápida, espontânea e sem esforço consciente. Muitas vezes, baseiam-se em crenças (ideias ou convicções aceites como verdadeiras, independentemente se há ou não evidência...