Medo.
Uma simples palavra que pode levar-nos no imediato a pensar em inúmeras coisas, muito possivelmente com graus diferentes de desconforto. Apesar de ter uma fama pouco simpática, o medo é, na verdade, uma das nossas emoções básicas e cumpre um papel fundamental nas nossas vidas. O medo ajuda-nos a protegermo-nos dos mais variados cenários e perigos (reais ou imaginários), porque atua ao desencadear no nosso organismo respostas cognitivas, psicofisiológicas e motoras de prevenção (quando hipotetizamos os mais variados cenários), e de alerta, que nos fazem evitar determinadas situações potencialmente perigosas.
Olhou para os dois lados antes de atravessar a estrada? Agradeça ao seu medo de ser atropelado por tê-lo protegido desse cenário pouco conveniente!
Tal como nós adultos temos a nossa bagagem de medos (uns mais conscientes que outros), também as crianças interagem com esta emoção e, regra geral, não fogem das reações fisiológicas que a resposta de medo pode desencadear no nosso corpo – batimentos cardíacos acelerados (taquicardia), respiração ofegante, sudorese, dilatação pupilar, sensação de frio/calor, tensão muscular, ou outras queixas somáticas (por exemplo, no caso particular (mas não exclusivo!) das crianças, as “dores de barriga”).
Como o medo é imprescindível para a nossa sobrevivência, o ideal não é suprimir a sua resposta, mas sim aprender a lidar com a emoção, para que ela não evolua para quadros clínicos de ansiedade, e não nos provoque reações de evitamento das coisas que precisamos ou queremos fazer (falar em público, frequentar eventos, ir ao médico, entre outros), nem a generalização desse medo a outros cenários semelhantes (por exemplo, desenvolver um medo generalizado a animais porque foi mordido por um cão).
Com os mais pequenos não é diferente. Em fases distintas do seu desenvolvimento neurológico, as crianças apresentam de uma forma geral alguns medos normativos, muitos deles incidentes em temas de imaginário/fantasia (por exemplo, medo das sombras que podem ser monstros, medo dos monstros debaixo da cama ou dentro do armário, de fantasmas, bruxas ou outras criaturas), e outros em temas da realidade quotidiana delas, como por exemplo, medo do escuro, de se magoarem, medo de serem abandonadas (que pode originar uma resposta de ansiedade de separação), de serem avaliadas (que pode tornar-se em ansiedade de desempenho), entre outros. O medo faz parte da vida. No entanto, é importante sabermos retirar o que de bom ele nos traz. Para isso, deixo como sugestão algumas estratégias que poderá adotar quando a sua criança manifestar uma resposta de medo, para que o medo que ela sente não passe a ser o seu medo de não saber lidar com a situação:
- Procure validar o que a criança está a sentir: faça perguntas e tente entender que é funcional e importante sentir medo. Pode dizer algo como: “Percebo que estejas com medo disto e é normal sentirmo-nos dessa forma. Todos nós temos medo de alguma coisa, mesmo as pessoas que dizem que não têm medo de nada! Ainda bem que me contaste este teu medo, porque assim posso ajudar-te a lidar com ele”;
- Procure manter a calma e falar de forma tranquila e pausada. Pode também oferecer alguma forma de conforto (por exemplo um abraço, ou agarrar na mão da criança enquanto fala);
- Tenha em conta que os medos requerem um trabalho tanto maior quanto maior for o grau de evitamento envolvido. Não obrigue a criança a enfrentar um medo sem preparação para isso: estará apenas a piorar a situação, uma vez que, sem estratégias ajustadas, esta poderá sentir-se ainda mais incapaz perante uma situação assustadora para ela, e isso reforça a resposta de bloqueio perante o medo;
- Da mesma forma, evite a superproteção (que pode gerar uma noção de ineficácia/incapacidade perante as adversidades);
- Evite a todo o custo expressões como: “O medo é para os fracos!”; “O medo não existe!”; “O medo é para os cobardes”; “Não sejas medricas”; … lembre-se: assumir o que sentimos, independentemente de ser medo ou não, é por si só um ato de coragem;
- Deixe a criança sentir a segurança de que pode contar consigo para falar dos seus medos;
- Quando a criança apresentar um medo normativo relacionado com o imaginário (monstros, fantasmas, entre outros), entenda que, na cabeça da sua criança, este medo é real (tal como no seu cérebro, quando o medo é seu!) e desta forma, evite a desvalorização do que é o sofrimento dela perante algo que “não existe”.
Por fim, esteja atento a sinais que indiciam que o medo evoluiu (e que poderá tornar-se uma fobia), tais como o evitamento reiterado, generalizações, reações desajustadas perante o estímulo causador da resposta de medo, entre outros. Neste caso, é essencial a procura de um psicólogo, para que sejam trabalhadas estas questões de forma clínica e evitar desta maneira o desenvolvimento de traumas.
Sara Morgado
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