Avançar para o conteúdo principal

Presenteísmo – quando não estamos por estarmos noutro lugar


Sabe, naqueles momentos em que estamos no nosso local de trabalho, mas a nossa cabeça foge para longe? Pode ser algo pontual, porque estamos num dia mau, mas também ser recorrente e, por esse motivo, afetar a nossa produtividade e desempenho, estando apenas de “corpo presente”. Identifica-se?

A esse estado dá-se o nome de Presenteísmo – conceito ainda pouco falado em Portugal, mas, efetivamente, muito presente nos trabalhadores e nas trabalhadoras e inerente a todas as funções e setores.

O Presenteísmo é caracterizado por um comportamento de ausência “invisível”, em que o indivíduo está presente no trabalho, mas, ao mesmo tempo, ausente em mente ou pelo seu comportamento, ou de forma que a sua produtividade seja afetada – no fundo, a pessoa comparece ao seu trabalho, mas não está totalmente envolvida ou não é produtiva nas tarefas que tem em mãos. Resultante dessa sensação de estar só de “corpo presente”, achamos, então, que perante os recursos que temos teremos um determinado resultado, mas acontece de termos resultados consideravelmente inferiores.

O Presenteísmo, enquanto fenómeno que impacta diretamente a rentabilidade das organizações, pode ser causado por uma variedade de fatores, ligados tanto à saúde física e emocional das equipas, como a características específicas de cada organização.

Fatores preditores de Presenteísmo:

Desmotivação/Descomprometimento– pela falta de reconhecimento ou oportunidades de crescimento, por desafios desajustados ao potencial e capacidade da pessoa ou por falta de interesse no tema da tarefa alocada, que condicionam o comprometimento e a motivação do colaborador ou da colaboradora;

Questões de Saúde Física e/ou Mental – pela relação inversamente proporcional entre o Presenteísmo e a Qualidade de Vida dos colaboradores, condições de saúde física (dor, doença crónica, enxaquecas, alergias) ou mental (ansiedade, depressão, stress, burnout) poderão condicionar o foco de atenção da pessoa nas tarefas que têm em mãos, levando a potenciar os sintomas de foro emocional, pela preocupação com o seu estado de saúde ou pela autorresponsabilização da diminuição da sua produtividade.

Conflitos Interpessoais – dependendo da gravidade de cada situação ou da capacidade de foco da pessoa em causa, problemas pessoais/conjugais/familiares poderão estar na base desta “falsa presença” no local de trabalho, uma vez que ocuparão o pensamento do colaborador ou da colaboradora numa procura incessante de solução para o seu problema.

Ambiente de Trabalho Disruptivo – uma cultura organizacional tóxica, na qual os colaboradores não recebem o apoio adequado para gerir o equilíbrio entre trabalho e a sua vida pessoal. Ambientes de trabalho desconfortáveis, sem os recursos ou equipamentos indicados ou suficientes para a execução das suas tarefas, barulhentos, muito quentes ou muito frios e interrupções constantes também podem afetar o bem-estar dos funcionários e sua capacidade de concentração.

Estilo de Liderança das Chefias – gestores que não fornecem feedback construtivo, não reconhecem o trabalho das suas equipas, sem disponibilidade para ajudar com problemas ou que criam um ambiente de trabalho stressante podem contribuir para a insegurança psicológica e, consequentemente, para o presenteísmo.

Sobrecarga de Trabalho/Acumulação de Funções – colaboradores que se sentem sobrecarregados, comparativamente com os seus pares ou por acumulação de funções, podem-se sentir incapazes de realizar o seu trabalho de maneira eficaz, levando ao presenteísmo.

A influência destes fatores no stress das equipas e consequentes alterações de humor e desmotivação podem levar os colaboradores ao descomprometimento com a missão e os valores das organizações, refletindo-se no seu envolvimento, proatividade e produtividade. Importa que, tanto organizações como colaboradores, na sua individualidade, assumam a corresponsabilidade de perceber que fatores poderão estar a levar a este comportamento. As organizações poderão implementar medidas internas que ajudem a reduzir o presenteísmo e a promover um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo, melhorando a saúde física e mental das suas equipas e, consequentemente, o seu desempenho.

Por outro lado, os colaboradores poderão investir no seu autocuidado e desenvolvimento de estratégias de coping mais adaptativas ao seu contexto de vida. Se perceber que o seu comportamento está a ser de presenteísmo, deverá procurar ajuda profissional no sentido de resolver os fatores que o levam a não estar minful no local onde está (seja trabalho, família ou outro contexto).


Dr.ª Raquel Gonçalves

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Inteligência Emocional na Docência: Estratégias para a promoção da Saúde Mental no contexto escolar

  A docência é, indiscutivelmente, uma profissão de elevada exigência emocional. Todos os dias, Professores e Educadores lidam com situações que exigem uma capacidade empática, de autocontrolo, resiliência e assertividade. Ser professor implica mais do que o domínio dos conteúdos . A prática docente é pautada por diversos fatores geradores de stress e sobrecarga, tais como: ⮚        Gestão de comportamentos desafiantes em sala de aula; ⮚        Pressão de familiares e sociais; ⮚        Falta de valorização profissional; ⮚        Conflitos com colegas ou direção; ⮚        Excesso de tarefas administrativas; A ausência de estratégias adequadas de regulação emocional pode levar a um estado de exaustão , caracterizado por sintomas como cansaço extremo, irritabilidade, isolamento social e sentimentos de inutilidade. Neste co...

Mobbing - nós crescemos (e o Bullying também)

O nosso local de trabalho - e com a palavra “local” refiro-me ao  espaço  de trabalho, que tanto pode ser um gabinete numa empresa como uma secretária na nossa casa - deve, idealmente, ser um espaço de colaboração, respeito, crescimento e segurança. No entanto, muitas pessoas não conseguem ter esta associação tranquila com o seu local de trabalho, associando-o à imagem de um ambiente hostil, inseguro, stressante e intimidante. Quando isto acontece, como consequência de comportamentos de humilhação, intimidação, imposição de regras ou limites injustos e pressão psicológica, estamos perante um cenário de  Mobbing , ou como é conhecido -  Bullying  no local de trabalho.  Com este artigo, vamos conhecer melhor que consequências o  Mobbing  pode trazer consigo, quais são os diferentes tipos, e que estratégias pode começar a aplicar para, dentro dos limites do que está ao seu alcance, fazer do seu local de trabalho um lugar mais feliz e equilibrado. Com...

Bonecas Reborn e a Dor Invisível – o peso de um colo vazio

    As bonecas  reborn , conhecidas pelo seu realismo, surgiram nos Estados Unidos entre o final dos anos 80 e início dos anos 90. Inicialmente, eram resultado do trabalho de artistas que transformavam bonecas convencionais em réplicas muito fiéis de recém-nascidos. Cada detalhe era cuidadosamente trabalhado: desde a pintura da pele, ao cabelo inserido fio a fio, até ao peso e textura corporal, conferindo-lhes uma aparência notavelmente próxima da realidade. O que começou como um passatempo artístico para colecionadores transformou-se num fenómeno com impacto emocional. Com o passar do tempo, estas bonecas começaram a ser usadas em contextos terapêuticos. Em lares de idosos, por exemplo, tornaram-se uma estratégia não farmacológica em situações de demência. A chamada  doll therapy  tem vindo a ser estudada como uma abordagem eficaz na diminuição de sintomas como agitação, ansiedade, agressividade e isolamento. Em alguns casos, verificaram-se melhorias no humor, ...