A urgência de um relacionamento amoroso e as suas consequências
Vivemos numa sociedade que valoriza e idealiza as relações amorosas, promovendo a ideia de que encontrar um(a) parceiro(a) é essencial para a realização pessoal e felicidade. Este contexto sociocultural pode gerar uma pressão intensa, levando muitos(as) a procurar relacionamentos de forma urgente e, por vezes, precipitada. Mas, será que se está verdadeiramente preparado(a) para estas relações? Ou será que a urgência de encontrar um(a) parceiro(a), muitas vezes, impede o estabelecimento de relações amorosas saudáveis e duradouras?
A influência da sociedade é poderosa, e pode moldar as expectativas e crenças sobre o que é necessário para sermos felizes. Desde a infância, somos expostos(as) a mensagens que engrandecem o amor romântico como o ápice da realização pessoal, através, por exemplo, de filmes, músicas e redes sociais, que levam à criação de uma imagem irrealista do amor e das relações.
A urgência em ter um relacionamento amoroso pode levar a um ciclo de relações insatisfatórias e frustrantes, resultado de escolhas impulsivas onde a compatibilidade emocional (Capacidade de se relacionar emocionalmente, partilhar sentimentos, mostrar empatia e dar apoio emocional) e psicológica (Conciliação das personalidades, valores, crenças e estilos de vida de duas pessoas) é frequentemente sacrificada para evitar a solidão e o medo de estar sozinho(a). Esta pressa pode levar à aceitação de comportamentos violentos por parte do outro, como por exemplo:
- Controlo excessivo: Imposição de regras sobre com quem se pode falar, onde se pode ir e o que se pode fazer ou vestir;
- Manipulação emocional: Fazer o(a) parceiro(a) sentir-se culpado(a) ou responsável pelo bem-estar do outro, culpar o(a) parceiro(a) pelas dificuldades no relacionamento sem assumir responsabilidade pelo próprio comportamento e utilizar a negação de carinho ou intimidade como punição ou controlo;
- Ciúmes e comportamentos possessivos: Questionamento constante da lealdade e fidelidade do(a) parceiro(a);
- Desrespeito contínuo: Desconsideração pela opinião, sentimentos e limites do outro, ridicularização, utilização de comunicação baseada em crítica, ironia, gritos ou insultos;
- Isolamento social: Tentativa de afastar o(a) parceiro(a) dos amigos, familiares ou outras redes de apoio;
- Violência verbal, emocional ou física: Agressões físicas, ameaças, insultos, humilhação.
Muitas pessoas carregam consigo questões emocionais de relações passadas, vividas na primeira pessoa ou através de alguém próximo, que influenciam negativamente os novos relacionamentos. Essas experiências podem criar padrões de comportamento disfuncionais, como por exemplo: dificuldade em expressar sentimento, medo do compromisso e desconfiança excessiva.
Antes de procurar uma relação amorosa, é essencial investir tempo no processo de autoconhecimento. Este processo envolve a exploração e compreensão das próprias emoções, comportamentos e valores. Permite identificar padrões de comportamento prejudiciais e substituí-los por padrões mais saudáveis, como por exemplo estabelecer uma base de confiança mútua e uma comunicação aberta e eficaz. Ao desenvolver uma consciência mais profunda de quem se é, do que se valoriza e das próprias necessidades emocionais, estamos mais bem preparados para estabelecer limites saudáveis, comunicar de forma eficaz e construir relações baseadas na confiança e no respeito mútuo.
Além disso, é fundamental respeitar a individualidade de cada um e reconhecer o outro pelo que ele é, e não pelo que se deseja que ele seja, permitindo assim a liberdade de ser autêntico dentro de um relacionamento amoroso. Idealizar o(a) parceiro(a) e a relação pode criar uma grande pressão, resultando em frustração e desilusão quando a realidade não corresponde ao ideal. Por isso, é importante ter expectativas realistas e compreender que todas as relações têm desafios e exigem trabalho contínuo. É importante não esperar que o outro mude para se ajustar às nossas idealizações, mas sim adaptar as nossas expectativas e compreender o que cada um está disposto a contribuir na relação. Assim, podemos ajustar a nossa própria atitude em resposta ao comportamento do outro, em vez de tentar controlá-lo externamente.
Preparar-se para uma relação amorosa saudável envolve mais do que simplesmente encontrar a pessoa certa. É necessário um trabalho interno de autoconhecimento, gestão de expectativas quanto ao outro e ao relacionamento, desenvolvimento de habilidades emocionais como por exemplo:
- Autoconsciência emocional: Prática de Mindfulness, registo diário das emoções, reflexão diária sobre o dia e identificar os momentos de stress, felicidade, frustração e as razões que levam a essas emoções. Além disso, é essencial cuidar da autoestima e do autoconceito, compreendendo a importância de se valorizar e de acreditar em si mesmo.
- Resolução de conflitos: Expressar sentimentos e necessidades de forma clara e sem julgamento, ouvir o outro e validar os seus sentimentos e opiniões;
- Comunicação assertiva: Dizer “não” de forma respeitosa, mantendo os limites de forma clara, dar feedback de forma construtiva, evitar generalizar as críticas, focar no comportamento específico e sugerir melhorias;
- Autocontrolo: Reconhecer e gerir as emoções, técnicas de relaxamento, evitar comportamentos impulsivos e manter a calma em situações de conflito.
Se sente dificuldades em estabelecer uma base saudável para uma relação ou impor limites saudáveis, procure orientação profissional. A sua felicidade e bem-estar emocional devem ser sempre uma prioridade e a expectativa social não deve ditar os seus passos em direção a um relacionamento amoroso, sobretudo se este não for saudável e não acrescentar valor à sua vida.
Dra. Joana Dias
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