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Mobbing - nós crescemos (e o Bullying também)


O nosso local de trabalho - e com a palavra “local” refiro-me ao espaço de trabalho, que tanto pode ser um gabinete numa empresa como uma secretária na nossa casa - deve, idealmente, ser um espaço de colaboração, respeito, crescimento e segurança. No entanto, muitas pessoas não conseguem ter esta associação tranquila com o seu local de trabalho, associando-o à imagem de um ambiente hostil, inseguro, stressante e intimidante. Quando isto acontece, como consequência de comportamentos de humilhação, intimidação, imposição de regras ou limites injustos e pressão psicológica, estamos perante um cenário de Mobbing, ou como é conhecido - Bullying no local de trabalho. 

Com este artigo, vamos conhecer melhor que consequências o Mobbing pode trazer consigo, quais são os diferentes tipos, e que estratégias pode começar a aplicar para, dentro dos limites do que está ao seu alcance, fazer do seu local de trabalho um lugar mais feliz e equilibrado.

Como se trata de um fenómeno de violência, nomeadamente do ponto de vista emocional, as repercussões do Mobbing podem ser variadas e estenderem-se para lá do que é o local e horário de trabalho, passando também, muitas vezes, para a nossa vida pessoal. O Mobbing, enquanto assédio laboral, consiste numa violação dos direitos humanos e envolve comportamentos indesejados considerados abusivos, que ocorrem de forma intencional e repetida, podendo incluir situações como:

- Exigência para o cumprimento de tarefas que ultrapassa o limite do que é previamente estabelecido (nomeadamente na exigência de respostas e conclusão de tarefas/resposta a emails fora de horas de expediente);

- Episódios de humilhação e crítica (não construtiva e/ou depreciativa) constante;

- Comportamentos (palavras, atitudes, gestos) que promovem um ambiente hostil, repressivo, desestabilizador e indigno;

-  Apropriação de ideias;

- Divulgação de rumores/boatos;

- Discriminação (religiosa, sexual, racial,...);

- Privação do exercício de funções (falta de acesso a recursos), entre outros. 

Todos estes fatores podem gerar consequências a vários níveis:

Psicológico/emocional – perturbações do humor (depressão), perturbações da ansiedade, baixa autoestima, desmotivação, burnout, ideação suicida;

Físico – dificuldades em manter padrões de sono regulares (insónia primária e/ou secundária, pesadelos recorrentes, sono não reparador), problemas gastrointestinais, hipertensão, dores e/ou tensão muscular, alterações no apetite, entre outras somatizações;

Laboral – dificuldades no cumprimento de tarefas, maior suscetibilidade ao erro, evitamento de tarefas (como consequência da ansiedade), incapacidade para comparecer em alguns compromissos, e nos casos mais severos, demissão;

Vida pessoal – isolamento social, incapacidade para manter a funcionalidade na vida para além do trabalho, perda de interesse por atividades prazerosas, dominância de temas relacionados com trabalho nos contextos sociais e pessoais, entre outros.

Mobbing pode também assumir diferentes formas de acordo com quem o perpetra: pode ter uma orientação verticaldescendente (quando é proveniente de um superior hierárquico), vertical ascendente (quando é proveniente de alguém hierarquicamente abaixo) ou horizontal (quando vem de um colega de trabalho com um nível hierárquico equivalente ao nosso) e pode, ainda, ser levado a cabo com diferentes propósitos: ou motivado por rivalidade, competição, antipatia, inveja (por exemplo), ou como estratégia organizacional levada a cabo pelas entidades empregadoras, para levarem um colaborador à demissão (e com isso beneficiarem de não ter de pagar indemnizações por despedimento injustificado, por exemplo). 

Seja de que tipo for, se estiver a ser vítima de Mobbing, mobilize-se. Há estratégias que deve colocar desde já em prática:

- Documente provas destes atos de abuso (emails, mensagens, testemunhos, etc.);

- Denuncie a quem de direito: Direção da empresa como primeira autoridade; Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) (https://portal.act.gov.pt/Pages/Home.aspx), Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) (https://cite.gov.pt/inicio) ou Polícia de Segurança Pública (https://www.psp.pt/Pages/homePage.aspx).

- Dê prioridade a cuidar de si – mantenha os cuidados básicos em dia, nomeadamente, o sono, a alimentação e a interação social;

- Procure apoio e ajuda de um psicólogo(a) – as consequências psicológicas do Mobbing são nefastas e afetam várias áreas da vida. Em muitos casos, pode ser necessária uma intervenção terapêutica estruturada que pode incluir os seguintes objetivos:  avaliar a gravidade dos sintomas e os seus impactos na vida quotidiana; fornecer estratégias para a regulação emocional; apoiar o restabelecimento das necessidades mais básicas (e.g., sono, alimentação, interação social), promover o reforço da autoestima e desenvolver as competências de comunicação (comunicação assertiva e a capacidade de estabelecer limites).

Acima de tudo, nunca se esqueça: conhecer os seus direitos é fundamental para agir no sentido da proteção dos mesmos. O Mobbing é regulado pelo Artigo 29º do Código do Trabalho e pela Lei nº73/2017. Nunca devemos ter uma posição de passividade perante a violência, seja ela de que forma for e merecemos trabalhar num espaço seguro, digno e respeitador – e isso não é um privilégio, é um direito!

 

 

Dra. Sara Morgado

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