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Ruminação: o que fazer quando a distração não funciona

 


É comum experienciarmos pensamentos negativos e repetitivos perante situações stressantes (ex., reuniões, avaliações, exames médicos, conflitos familiares, questões financeiras). Contudo, quando estes pensamentos se manifestam de forma persistente e estão relacionados as estas situações que causam sofrimento emocional, isso pode significar que está preso/a num ciclo ruminativo.

O que é a ruminação?

A ruminação consiste num padrão de pensamento perseverativo, e, geralmente, involuntário, marcado por pensamentos negativos, repetitivos e recorrentes, que pode ser focado na pessoa (ex., “porque me sinto assim/porque sou assim”) ou nos eventos (ex., causas e consequências), frequentemente desencadeado por experiências ou estados emocionais negativos. Este padrão de pensamento pode-se manifestar face a uma situação stressante que já ocorreu (ex., a pessoa pode ruminar sobre uma interação social que lhe causou vergonha) ou que pode vir a acontecer (e.x., ruminar sobre uma entrevista de trabalho).

A ruminação é considerada um mecanismo de coping desaptativo, porque essa forma de reagir mantém a pessoa focada nos efeitos negativos do evento, perpetuando assim a experiência de emoções negativas em vez de contribuir para a resolução de problemas. Além da ruminação exacerbar e prolongar o humor negativo, ela tem sido associada a problemas de sono e a várias perturbações psicológicas, tais como, ansiedade, depressão, compulsão alimentar, consumo excessivo de álcool e aos comportamentos autolesivos (ex., Nolen-Hoeksema, et al., 2007; Watkins & Roberts, 2020).

Como lidar com a ruminação?

É muito comum as pessoas recorrerem à distração para lidarem com a ruminação. Esta consiste em direcionar a atenção para outras atividades, como ler, ouvir música, trabalhar ou praticar exercício físico, o que pode ajudar a interromper temporariamente o ciclo ruminativo. No entanto, trata-se de um alívio apenas de curto prazo. Quando a tendência para ruminar é recorrente, torna-se essencial recorrer a estratégias mais eficazes para gerir este padrão de pensamento, tais como:

a)        Mindfulness – praticar mindfulness ajuda reduzir a ruminação porque esta técnica ajuda a pessoa a focar a atenção no momento presente em vez de ficar presa nos acontecimentos passados ou no que pode vir a acontecer, isto é, no futuro;

 b)       Escrita – escrever os seus pensamentos ajuda a reduzir a ruminação porque ao passar para o papel as preocupações, está a “desocupar” a mente com o que lhe preocupa. Além disso, a escrita promove a autorreflexão, isto é, ajuda-lhe a rever o que aconteceu, bem como, as possíveis aprendizagens que pode retirar da situação, em vez de ficar no ciclo ruminativo;

c)        Agenda da preocupação consiste em reservar um momento específico do dia (ex., às 19h) para se preocupar. Ao longo do dia, deve anotar as preocupações que surgirem e guardá-las para esse momento definido cerca de 20 minutos em que poderá refletir sobre elas de forma intencional. Após esse período, sempre que notar uma nova preocupação, deve adiá-la para o próximo momento reservado para a agenda da preocupação. 

Contudo, se nota que mesmo com a utilização destas estratégias, continua a sentir dificuldades em lidar com a ruminação, procurar apoio psicológico pode ser um passo fundamental, pois o profissional pode ajudá-lo a identificar os padrões de pensamento associados à ruminação e desenvolver formas mais adaptativas de os gerir.

Referências

Nolen-Hoeksema, S., Stice, E., Wade, E., & Bohon, C. (2007). Reciprocal relations between rumination and bulimic, substance abuse, and depressive symptoms in female adolescents. Journal of Abnormal Psychology, 116(1), 198–207. https://doi.org/10.1037/0021-843X.116.1.198

Watkins, E. R., & Roberts, H. (2020). Reflecting on rumination: Consequences, causes, mechanisms and treatment of rumination. Behaviour research and therapy127, 103573. https://doi.org/10.1016/j.brat.2020.103573

Dra. Jacqueline Ferreira 

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