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Inteligência Emocional na Docência: Estratégias para a promoção da Saúde Mental no contexto escolar

 

A docência é, indiscutivelmente, uma profissão de elevada exigência emocional. Todos os dias, Professores e Educadores lidam com situações que exigem uma capacidade empática, de autocontrolo, resiliência e assertividade.

Ser professor implica mais do que o domínio dos conteúdos. A prática docente é pautada por diversos fatores geradores de stress e sobrecarga, tais como:

       Gestão de comportamentos desafiantes em sala de aula;

       Pressão de familiares e sociais;

       Falta de valorização profissional;

       Conflitos com colegas ou direção;

       Excesso de tarefas administrativas;

A ausência de estratégias adequadas de regulação emocional pode levar a um estado de exaustão, caracterizado por sintomas como cansaço extremo, irritabilidade, isolamento social e sentimentos de inutilidade. Neste contexto, a Inteligência Emocional surge como um fator protetor essencial para a promoção da saúde mental dos Professores e Educadores, que os poderá ajudar a superar estes desafios e permitir-lhes um maior equilíbrio entre a vida pessoal e profissional.

Segundo Goleman (1995), a Inteligência Emocional refere-se à capacidade de identificar, compreender, gerir e utilizar as emoções de forma construtiva. No campo educativo, onde as relações humanas são centrais, estas competências tornam-se determinantes para o bem-estar dos professores e para uma boa gestão das suas salas de aula:

Melhoria na gestão do stress – O desenvolvimento desta competência permite aos professores identificar sinais de sobrecarga e adotar estratégias que respondam às suas necessidades emocionais, oportunamente.

Redução de conflitos interpessoais – Através de uma atitude empática e de escuta ativa, poderão estabelecer uma comunicação mais assertiva e menos reativa, o que facilita a resolução de conflitos com alunos, colegas, diretores e famílias.

Modelo emocional para os alunos – Professores capazes de reconhecer as suas emoções conseguem mais facilmente reconhecê-las e validá-las nos seus alunos, criando um ambiente mais positivo e seguro. Ao demonstrar a sua capacidade de autorregulação, autocompaixão e empatia, os professores atuam como referências emocionais, ensinando essas competências de forma implícita.

Promoção do bem-estar docente – Associada a maior satisfação profissional, autoestima e motivação intrínseca, poderá reduzir a prevalência de sintomas de Ansiedade, Depressão e Burnout.

Melhoria no ambiente escolar – Através da Inteligência Emocional, os professores poderão criar salas de aula mais colaborativas, o que poderá fortalecer a relação entre professor e aluno e, consequentemente, reduzir a indisciplina. Nas relações com os seus pares, promove a cooperação, uma comunicação eficaz e a capacidade de resolução de problemas nas suas equipas.

O desenvolvimento da Inteligência Emocional envolve cinco competências fundamentais: autoconhecimento emocional, autocontrolo emocional, motivação, empatia e competências sociais. Na prática docente, estas competências poderão ser desenvolvidas através de práticas consistentes de desenvolvimento pessoal:

Escrita Terapêutica Livre – Escrever sobre as emoções vividas no dia poderá ajudar a desenvolver o autoconhecimento e a identificar padrões e necessidades emocionais.

Exercícios de Mindfulness e de Respiração – Implementar técnicas de mindfulness e de respiração (ex., respiração diafragmática) na rotina poderá ajudar a reduzir sintomas de ansiedade e pensamentos intrusivos.

Reestruturação CognitivaAtravés da reestruturação do pensamento sobre situações difíceis, e ressignificando estas mesmas situações de uma forma mais construtiva, poderá reduzir o seu impacto emocional negativo.

Escuta Ativa e Empática – Praticar o ouvir sem interromper e o compreender o ponto de vista do outro, sem acusações ou julgamentos, ajudará a fortalecer as relações e a diminuir o risco de conflitos e divergências.

Supervisão Pedagógica e Mentoria – Criar espaços de reflexão partilhada entre docentes poderá fortalecer vínculos, a segurança psicológica e promover um apoio emocional mútuo.

Numa profissão em que o vínculo humano é um elemento central, cultivar a consciência e a regulação emocional é tão necessário quanto o domínio dos conteúdos e das estratégias pedagógicas. Apesar de se saberem os benefícios, em muitos contextos, o receio de mostrar vulnerabilidade ainda leva muitos professores a ignorar os próprios sinais de esgotamento.

Mais do que nunca, é fundamental que Professores e Educadores apostem no desenvolvimento destas competências, como forma de promover a sua saúde mental e qualidade de vida. O cuidado emocional deve ser entendido como parte da prática docente e não como fragilidade.

Se sentir que enfrenta dificuldades relacionadas à sua regulação emocional ou percebe que precisa de desenvolver mais estas competências, é importante procurar o apoio de um profissional de saúde mental que possa acompanhá-lo/a nesse processo e ajudá-lo/a a identificar estratégias adequadas ao seu perfil.

Dr.ª Raquel Gonçalves 


Fontes:

Goleman, D. (1995). Emotional intelligence. New York: Bantam Books.

Jennings, P. A., & Greenberg, M. T. (2009). The prosocial classroom: Teacher social and emotional competence in relation to student and classroom outcomes. Review of Educational Research, 79(1), 491–525. https://doi.org/10.3102/0034654308325693

Organização Mundial da Saúde. (2020). Burnout: Síndrome ocupacional. https://www.who.int/mental_health/evidence/burn-out/en/

 


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